sábado, 6 de junho de 2009

Os inocentes sentem raiva

por Fernanda da Costa
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RÁ!

RÁ-rá
Rá-rá-rá
Rá-rá-rá-rá
Rá-rá-rá-rá-rá
Rá-rá-rá-rá-rá-rá
Rá-rá-rá-rá-rá-rá-rá
Rá-rá-rá-rá-rá-rá-rá-rá
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Era incontrolável. Era uníssono. Todos haviam sucumbido às risadas maléficas que perfuravam meu âmago. Para quê? Por quê? Tinha vontade de cortá-los em pedaços. Arranhá-los com espinhos do mesmo veneno com que me arranhavam. Espinho verde-vivo, que deixava o veneno ardido. Ardendo.
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Tinha outras vontades. Tinha vontades de feri-los levemente. À todos eles, à todos que riam. E mais. Mais, sempre mais. Tinha vontade de ver os ferimentos se abrindo levemente. Revelando que por baixo da fina camada de pele existe sangue fresco. E após o sangue escorrer, quando a ferida se prepara para cicatrizar, temperar com sal e vinagre. E ver ferver. Ver arder. Ver doer.
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Ah, que gostosos gritos que fazem meu pensamento voar de prazer. Tiro os sapatos para sentir o chão frio-de-pedra. O gelo atravessa às meias. A pele sente-o e o meu coração goza. Enquanto isso a pele deles frita ao absorver meu alquimismo vinagre-sal.
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Frita, pele. Frita. É prazeroso, mas ainda não me sinto bem. Nem meu pensamento me satisfaz. Nenhuma dor física é comparada com a dor psicológica que estou sentindo. Humilhação. Humilha, são.
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São um cardume de piranhas a morder-me a cada rá. O que eu fiz além de sonhar?
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Rá-rá-rá-rá-rá-rá-rá-rá
Rá-rá-rá-rá-rá-rá-rá
Rá-rá-rá-rá-rá-rá
Rá-rá-rá-rá-rá
Rá-rá-rá-rá
Rá-rá-rá
Rá-rá
...
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- Silêncio!
Ela fala.
As ondas de risada cessam levemente.
Coloco meus tênis fora de moda. Dou adeus ao gelo.
Aconchego em desconforto.
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