Karina Rigo, acadêmica de jornalismo, VII nível
Confesso que a passagem para o ano 2000 foi uma das que mais me amedrontou na vida: era o ano da minha sétima série do Ensino Fundamental (na época primeiro grau). Meu irmão já tinha feito o favor de me deixar bem insegura em relação ao primeiro contato com a saudosa mitocôndria e sua função respiratória, com os bolcheviques (a patota do Lênin) e mencheviques (aqueles outros) e com as figuras pontilhadas de nanquim pra dar uma relaxada nos últimos períodos das quintas-feiras.
Era o ano das mudanças bruscas. Enquanto o corpo mudava muito, as informações começavam a ter uma influência mais pesada na construção do pensamento. Eu assistia às Chiquititas no fim da tarde e, no início da tarde do dia seguinte, eu ouvia atenta sobre o capitalismo e a Guerra Fria e percebia claramente o esforço da professora em estabelecer a importância do ser, acima do ter. E, de alguma maneira, as palavras delas me faziam admirá-la.
Em uma daquelas aulas de geografia, a já, na época, estimada professora Maria Carolina falava sobre a diferença entre ministrar aulas em uma escola particular e uma escola pública. “Eu ouvi de um dos meus alunos da escola privada onde eu trabalho, que eu tenho obrigação de aceitar o que ele faz porque ele está pagando”, dizia a professora com um tom de mágoa misturada com decepção. Ela sabia que muitos dos alunos dela teriam essa linha de pensamento: o dinheiro compra o respeito. E, naquele dia, eu senti que aquilo a entristecia de verdade. Ouvi esse tipo de discurso de vários outros professores, mas o dela, o mais simples, impregnou.
Passou o tempo, a linha de pensamento permaneceu tomando rumos diferentes e nunca parou de estabelecer uma concepção. Convicção de que as pessoas têm de lutar pelo que querem e que o capitalismo é um sistema que, realmente, dá liberdade para isso, “quero ser rico e quero que todos sejam também”. Aí veio a faculdade e um professor que me impulsionou a continuar pensando assim.
Ok. Acordei, li Milton Santos e resolvi dar ouvidos a algumas divagações de outro professor e a convicção de agora é a de que, se a tendência da humanidade (que, para Milton Santos, nunca chegou a ser humanidade), for de cada um pensar por si e por alguns poucos que os rodeiam, o todo nunca vai ter jeito mesmo. Não fomos educados para pensar no todo, no público, pensar unificadamente para um bem que ultrapassa o perímetro do terreno residencial.
Desde a última vez que eu ouvi falar sobre ela, a professora Maria Carolina estava internada em um hospital psiquiátrico. Talvez, ela tivesse muitos problemas com a família, ou financeiros, ou de saúde, ou todos juntos. Ou talvez ela tivesse se desiludido mesmo com a tal “humanidade”.
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